quarta-feira, 14 de outubro de 2015


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De como jogar pigue-pongue sem deixar a bolinha cair
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De todas as construções humanas essa - o cemitério - é um das mais significativas, enquanto ainda a vida a viver é preciso que em oníssono todos admitam:

- Ao certo, ninguém sabe de porra nenhuma.
O tempo e o registro histórico vem ridicularizando todas as crenças, saberes e ciências sem exceção. Não porque sejam mentira, mas porque nunca foram verdade. Afinal para ser verdade singular a aplicável a todos sem exceção teria que possuir todos olhos, ouvidos, tatos, olfatos e todas as outras maneiras de experimentar a existência para que se pronunciasse de um lugar sem exceção. Nunca houve e talvez nunca haverá o que represente a verdade, exceto se assumir mentira ou verdade parcial.

Mas existem mentiras, ilusões, menos ou mais agradáveis, construtos mentais menos ou mais agradáveis, que melhor se adaptam ao que você tem potencial para ser e que te elevam a condição da satisfação para consigo. Óbvio que mentira assumida por lógica assume carácter de verdade.

Para quem assistiu "Caverna do Dragão" vai entender: é aquilo e talvez um dia acabe assim como acabou o desenho animado, sem final e simplesmente porque os jogadores pararam de jogar RPG e de inventar o roteiro.

E para quem não assistiu eu resumo: um grupo de jovens está preso à uma existência diferente da deles, como que em outro mundo, então vão cumprindo provas para sair desse mundo e voltarem para casa, mas a série de desenhos acaba e é isso. Eu teria tentado comer o 'Hank', formar família e ficar por lá mesmo, sem sofrer pela mediocridade de conviver com quem 'compõe estatuto da família' no séc. XXI, mas não tive a mesma sorte que eles e estou em outro brinquedo do parque de diversão.

Tem uma lenda urbana de final para "Caverna do Dragão" que só existe no Brasil e surgiu no Festival de Cinema de Tiradentes, nela dizem que o Vigador é filho do Mestre dos Magos, etc. Mas essa foi a forma como nós brasileiros fãs fomos capazes de lidar com ausência de razão que nos parecesse significativa para ter acabado o desenho animado.

Nossos 'significados', 'razões' são tendenciosos, comprometidos sobre vários aspectos, para começar pela necessidade de ter significado, lembrando que ter significado parece condição de satisfação da nossa espécie, outras dispensam essa 'necessidade' e são simplesmente.

A mim quando relativizo dessa forma faz surgir uma sensação de vazio, porque eu sempre acreditei e fui encucado que existisse uma 'razão', um 'sentido', um 'significado', etc E preste atenção, eu não estou negado essa possibilidade, mas estou dizendo que se existir qualquer 'significado', para que ele compreenda e satisfaça o fenômeno existência por inteiro deve extrapolar esse conceito - mesmo por aproximação - então já não serviria a nós como espécie, que somos só parte do todo manifesto. Sua inteireza não caberia no conceito.

Em mim, sei que a dor nasce do pensar e da memória, toda vez que me coloco presente e atuante sob as circunstâncias presentes tenho a liberdade de um bicho, de um animal e costumo experimentar alguma plenitude de reatividade às circunstâncias reais com medidas proporcionais de ação. Acho que essa deve ser a mesma experiência dos equilibristas, acrobatas e outros que são mais evoluídos em sentido motor que a grande maioria - eu queria ser igual e esse pensamento me faria sofrer se eu não soubesse que pensar é causa de sofrimento, porque me desloca para o abstrato, me tira das condições circunstanciais reais e presentes -, mas voltando aos equilibristas, acrobatas, me parece que eles se educam para não pensar e simplesmente reagem ao fluxo com medida natural justa e talvez também por isso tenham êxito.

Existe dor nos pensamentos nos quais você se associa ou se faz tema; ideias sem envolvimento pessoal por si são confortáveis de serem pensadas.

Por fim, fazer isso não invalida nenhum caminho e justifica todos, o fato de não existir a linha reta talvez te inspire a respeitar todas as linhas curvas.

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Eu menti em muitas linhas e se você mentir junto comigo não faz disso uma verdade, mas torna possível falarmos agradavelmente sobre a mesma mentira.

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            Imagem: In London's Highgate Cemetery,
            by Hannah Davis; http://bit.ly/1Lfl5f3
            Faerie Magazine

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