quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Terra é início/fim, ciclo de toda a vida; no entre, estamos nós e as opiniões.

Da primeira memória


   Quando vejo um recém-nascido em contato com o ambiente, imagino que esteja observando este ambiente e formando sua mente.  Este recém-nascido tem acesso a odores, a texturas, a imagens, canções tradicionais, discursos diretos e discursos indiretos, etc - sua capacidade de memorizar está em desenvolvimento -, e estas serão suas primeiras memórias, que possivelmente se tornarão inconscientes.   Aqueles que cuidam de crianças têm como característica:


·         Falar de modo infantilizado;
·         Falar metaforicamente;
·         Contar ‘estorinhas’;
·         Promover pequenos sustos como brincadeira;
·         Descuidar na linguagem e/ou nos comportamentos.

   
   Penso que a transmissão de valores culturais, folclóricos [ folk ( povo ) + lore ( saber ) ],  tem sua inauguração neste momento.    Acrescento o primeiro desenvolvimento afetivo e motor.


domingo, 27 de outubro de 2013

Notas psicanalíticas

   A perversão polimorfa nas crianças também pode associar-se aos movimentos, gestos, comportamentos, verbalizações, que se fazem de modo multidirecional.  O fluxo da libido foge a uniformidade.
   
 

   Na vida adulta há recorrência estrutural nesse fluxo de libido; simplificações:
 
   Histeria dá o sentido de necessidade de preenchimento, de vontade e de desejo;
 
   Neurose obsessiva dá o sentido de ocupação, de esclarecimento, de entendimento;
 
   Psicose dá o sentido de entendimento particular ( não compartilhável ), de delírio, de alienação;

   Perversão dá o sentido de versão própria, de lugar do entendimento e vantagem.

   

sábado, 26 de outubro de 2013

O ser e o ambiente


   Transformar em som ou em palavra é a segunda ação de reposta do ser estimulado pelo ambiente, sendo as ações  corporais a primeira resposta.

   
   Chamo fator de identificação o que faz o ser agir estimulado pelo ambiente.  Suponho tratar-se de algo que já faça parte da mente do ser e responde ao estímulo do ambiente como em um esquema de chave-fechadura ( encaixe ).

sábado, 19 de outubro de 2013

Encontro

Inusitado

Reencontro

Seriado

Cama

Apreciação

Fala o corpo mais que palavras.  


- Te quero no toque que tem mais de um significado.

domingo, 13 de outubro de 2013

ORATE

ORATE

  
Poucas pessoas sabem como trabalham os anjos.

   
   Em uma tarde de sexta-feira uma criança foi vitima em um incêndio, os bombeiros que chegaram ao local nenhum vestígio encontraram que desce sentido ao ocorrido, mas foram informados pelos vizinhos que ali morava uma família bastante reservada.
   Dias depois do ocorrido, o trabalho de peritos e investigadores mesmo sem concluir a causa do incêndio conseguiu identificar cinzas humanas entre os destroços, testes em laboratório deixaram evidente que três pessoas foram vitimadas pelo incêndio sem causa aparente.
  
A criança vítima do incêndio se chamava Ângelo.
 
    As semanas que seguiram o ocorrido foram de muita dor e pesar, ultrapassando o sentimento de familiares e amigos, comovendo toda a população da cidade.
  
Até que todos se esqueceram.

   Levada pela mãe ao psicólogo, uma pequena menina chamada Elisa insiste em dizer que conversava com garoto que estava infeliz e perdido no escuro.   Em um primeiro momento, imaginou se tratar de carência a construção de um amigo imaginário naquela idade, uma forma de chamar atenção, talvez um traço histérico.   Os encontros com psicólogo continuaram até que um novo elemento surgiu na narrativa da menina, ela disse que o menino chama-se Ângelo.  Ambos, psicólogo e mãe ficaram assustados, e a menina acrescentou: Ângelo estava preso entre o céu e a terra, e seres estranhos vinham disputar sua alma, nesta disputa uma sequência destruição aconteceria na cidade – porque uma alma inocente estava presa.

A prisão de uma alma inocente era capaz de abalar céus e terra.

   A mãe estava assustada e manteve a menina em acompanhamento psicológico, mas o susto maior foi quando os eventos previstos pela menina se confirmavam ao passar de cada dia.   O psicólogo mantinha-se calmo e tentava buscar explicações científicas, mesmo vendo que estas explicações eram insuficientes.    Ele escolheu assumir uma posição mais lógica frente ao que ele podia observar.  

Final de expediente.
   O psicólogo despede de uma paciente enquanto aguarda a chegada de Elisa, sua última consulta.   Ele olha em volta buscando pela secretária com objetivo de pedir a ela que adiante a agenda da próxima semana.  Ficou surpreso ao notar papéis remexidos em cima da mesa, foi até o banheiro, mas o banheiro estava vazio e a porta aberta.   De imediato tentou ligar para o celular da secretária e sem nenhum sucesso em suas tentativas, ligou para polícia para notificar o ocorrido.  Na sala de consultas o telefone toca.  Ele corre na esperança de ter alguma explicação sobre o que havia acontecido em seu consultório, mas do outro lado da linha algo ainda mais preocupante: a mãe de Elisa disse que ela e sua filha foram perseguidas durante toda a semana, muito assustadas, as duas se refugiaram na casa de campo de familiares.
  Ele correu até o banheiro para passar água no rosto e se acalmar, o vapor de água que saiu da torneira revelou uma palavra no espelho: ignore.   Trêmulo, ele correu até o escritório, pegou sua pasta e chaves do carro, enquanto tentava ligar do celular para conseguir o endereço do lugar em que as duas estavam escondidas.  Alguns toques, até que Elizabeth atende o telefone.   Ela resistiu bastante até passar o endereço.   Com endereço em mãos, o psicólogo correu um lance de escadas para chegar mais rápido ao estacionamento do prédio.   Já na saída do estacionamento, ele notou que o trânsito estava mais congestionado que o normal.

A chegada.
   O lugar era uma antiga vila guardada pelas montanhas. 
   Diminuiu a velocidade do carro, para observar os detalhes que o levariam à casa dos familiares de Elizabeth, demorou poucos minutos até que ele pode identificar uma casa azul em um elevado, escondida por entre floridos arbustos.   Estacionou o carro e tocou um sino preso no portão da casa para anunciar sua chegada; Elizabeth aparece em uma das janelas dizendo que ele poderia estacionar o carro no jardim.
  A casa era aconchegante e arejada; sala ampla com móveis antigos.  Elisa apareceu na sala acompanhada por uma senhora de semblante sereno; a menina parecia estar feliz naquele lugar.   
   De repente a senhora sorrindo disse: - Não se preocupe doutor as legiões de anjos guardam este lugar.   Curioso, ele sorriu em resposta para a senhora esperando que ela continuasse o a falar, então ela disse: - A frase no banheiro é a que menos devia ter te preocupado, eles queriam te proteger de algo muito maior que está por vir, podia ter sido ‘cuida-te’, mas eles acharam que te fazendo medo seria mais marcante. 
   Irritado, pensou que se tratasse de uma armação.   Era evidente que estava com musculatura tensa,  a ponto de explodir.   Então a senhora disse: - Sua secretária quis o mal da menina Elisa, quis vende-la; sua secretária achou que seria um bom negócio fazer de Elisa uma ferramenta de previsões, além de ignorar a dor de uma criança perdida entre os céus e a terra – revolta os anjos explorar inocentes em apuros.  Sem estar convencido de se tratar da verdade, mas tentando se acalmar, o psicólogo, começou a repassar os fatos e se manteve respeitando a versão daquela senhora.  Neste momento uma rajada de vendo invadiu a sala da casa, folhas secas das árvores tomaram todo o lugar. As folhas, em suspensão, caíram pouco a pouco formando no piso de madeira a palavra: acredite.   Ele sabia que aquilo ultrapassava sua capacidade de entendimento, porém reconhecia que sua função era manter a lucidez; sua forma de contribuir era ser aquele que assume a dúvida.

A semana.
   Durante a semana ele continuou a atendimento clinico da menina e a pedido da mãe, acompanhados por aquela senhora.  Durante as consultas novas revelações aconteciam e incidentes eram anunciados.  Por precaução eles iam a cada lugar, e do mínimo ao máximo, cada um dos incidentes se confirmavam. 
  Noite de sábado, zero hora.    Todos estavam em suas camas, sendo uma noite quente e o lugarejo seguro, as janelas permaneceram abertas; de súbito, uma nova rajada de vento tomou conta do em torno da casa, todas as janelas bateram e se trancaram no mesmo instante.  O psicólogo levantou assustado para observar se todos estavam seguros, gritos de Elizabeth tomavam conta de casa, quando ele chegou à sala notou a menina em transe, ela falava muito rápido, a senhora tentava compreender o que era dito.   Então reaparece o menino Ângelo, ele conseguiu reencontrar Elisa, disse que legiões de anjos estavam tentando resgatá-lo, mas outros barganhavam sua alma.   A menina cai sonolenta e suando frio.  
   O psicólogo está absorvido pelo que viu;  a senhora depois de acomodar Elisa no sofá da sala, vai até ele e diz que todos estavam correndo perigo, e que a medida mais segura a fazer era mais preces.   Neste momento ele fica enfurecido, sem entender como pedir proteção de forma tão insubstancial poderia ser útil, a senhora o interrompe e explica: - Doutor faça o que você achar melhor, mas a oração tem muita importância agora.

Na vila.
   O psicólogo vai até o centro daquele pequeno vilarejo em busca de ajuda médica, sua esperança era encontrar algum ambulatório ou mesmo uma única placa de um consultório médico particular.  
   Chegou a uma pequena praça circular com um belo coreto central.  Luzes de mercúrio davam um tom avermelhado à praça.  
   Enquanto ele caminha buscando ajuda, começa a ventar, o vento traz densas nuvens negras que cobrem todo o céu da cidade, os brinquedos no parque rangem à medida que o vento aumenta; janelas e portões batem. Olhando o céu ao longe era possível ver raios cortantes deixando suas marcas e sumindo em fração de segundos.   Subitamente, ele escuta um grito, quando olha para o lado direito percebe que este grito vinha de uma das casas, não demorou muito para que o mesmo acontecesse nas outras casas, as luzes tremulavam, pessoas em desespero, sem que ele soubesse a razão.   Vento e sons estranhos tomavam conta do local.    Os animais respondiam com mesmo desespero.
  Elizabeth, a senhora e Elise encontram o doutor no centro da cidade, o lugar está tomado pelo terror.   Os moradores saem de suas casas desesperados.   Elisa está aos prantos dizendo que eles precisam se refugiar num lugar seguro.  
   Vizinhos, familiares e crianças se agrupavam para se protegerem.   Naquele momento as diferenças entre eles diminuíam, percebiam que algo muito maior que suas forças se fazia presente.  
  Um senhor, provavelmente um dos mais antigos moradores da cidade, lembra-se do antigo depósito de grão da fazendo mais antiga da vila, ele sabia que o lugar suportaria a tempestade e teria espaço suficiente para abrigar todos.   Rapidamente, carros, caminhonetes, motocicletas tomam as ruas da cidade e partem a caminho do antigo depósito.

Antigo depósito.
  Crianças, mulheres e homens saiam dos veículos e corriam com lanternas de mão em direção a entrada principal do depósito, enquanto outro grupo saiu em reconhecimento do lugar; buscavam fonte de água e energia.
  Em pouco tempo a equipe de reconhecimento encontrou um gerador de energia à gasolina e um reservatório com água suficiente.   Tinham luzes acesas e água alimentando o depósito.
   Todos permaneceram juntos e assustados com proximidade e violência da tempestade.  
   Do lado de fora, o uivo do vento se confunde com sons de animais e outros sons irreconhecíveis.
   O doutor cuida de Elisa, que está exausta, amparada no colo da mãe.  
   A senhora se coloca ao centro e tenta pedir às pessoas que se acalmem, mas um forte trovão é que consegue o silencio que ela queria.   E ela aproveita a oportunidade: - Vocês vão estanhar meu pedido, mas quero que saibam que se trata de algo muito importante, quero que vocês façam orações para um menino, Ângelo precisa de nossas orações. 
   Em seguida todos começam a orar ao mesmo tempo: orações tradicionais; rezas; clamores tomam conta do lugar; símbolos; seres diversos são evocados como forma de proteção.   A senhora está ao centro.

Metatron
   Um grande estrondo como que um trovão acompanhado de fortes luzes preenche todo o lugar calando todas as vozes e cegando todas as pessoas naquele instante – agora, somente luz e silêncio.   Então muitas vozes são ouvidas ao mesmo tempo.  Intensa luz preenche tudo e as vozes se dividem, cada pessoa escuta uma voz diferente e familiar em seu ouvido:
  - É preciso que saibam um segredo, os anjos se alimentam de nossas intenções, boas ou más é disso que eles se servem, Ângelo está perdido porque nós estamos perdidos antes dele, suas intenções estão confundido a alma deste menino, façam silêncio.
   E à medida que as pessoas se acalmavam também a tempestade passava.
  

     




  

  


   

sábado, 12 de outubro de 2013

Pataxó

   Eu estava em sala de aula, quando percebi uma movimentação diferente na quadra da E. M. Dom Justino - situada em Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil, tarde de 11 de outubro de 2013 -, desci até a quadra da escola envolvido na atmosfera que a música e o silvo de pássaros criavam em mim. Ao chegar no referido local, vi nativos brasileiros em torno de objetos que correspondiam à sua etnia, disposto no chão em forma circular; alunos curiosos ocupavam a arquibancada da escola e professores estavam junto aos nativos, admirando os objetos trazidos para a exposição pela etnia mencionada. 
 
   Em um primeiro momento, me fiz distante e me sentei com os alunos, quando percebi que também eu podia estar mais próximo dos nativos brasileiros, me levantei e fui ao encontro destes; atendo ao que haviam trazido para a mostra, observei  cada um dos objetos dispostos no chão e - estando estes à venda -, movido pelo gosto escolhi um belo colar [ formas circulares de material orgânico de cor negra ]; conversei com uma nativa que me informou o valor, comprei o colar e esta me disse algo em sua própria língua.   Então, eu fui em direção aos alunos movido por um estímulo diferente, senti uma transformação naquele gesto tão simples, e à medida que coloquei o colar, mais intenso ficou em mim a atmosfera pessoal oriunda daquele contato.
 
   Jornalistas também estavam presentes registrando o encontro; outros - que pareciam acompanhar os nativos, mantinham-se envolvidos às atividades ou observando de longe o evento -; havia uma nativa que demonstrava desenvoltura ao falar e que representou os demais nativos neste aspecto. Na ocasião em que teve início o rito representativo da cultura Pataxó, esta mesma nativa fez menção a Jesus e posteriormente o grupo celebrou em movimento e em linguagem oral - correspondentes à esta etnia -, uma representação restrita a eles, que depois foi estendida aos demais presentes na quadra da escola. Notei que o movimento circular era fundamental, toda a sequência de representação cultural tinha o movimento circular em sua estrutura elementar; incluo que mãos e pés alternavam; também alternavam em: intensidade, direção e sentido entre os nativos em fila.
   A beleza do evento causava estranheza e admiração entre os participantes envolvidos ou que optavam por observar; emoções diversas eram manifestas.

    

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Dionisus e o jarro de cerâmica


Para se tornar um deus e desfrutar de todas as delícias do Olimpo, o filho bastardo de Zeus, Dionisus teve que passar por inúmeros desafios em sua vida. O semideus Dionisus viveu junto aos Sátiros, sempre buscando um lugar no Olimpo e enfrentando a implacável madrasta Hera. Mas Dionisus contava com a ajuda do sábio Sileno, seu mestre, e com a companhia do grande amigo Ampolos. 


Sileno era o responsável pela educação de Dionisus, tinha uma experiência única nos conhecimentos do mundo natural e da magia, vivia criando desafios para instruir Dionisus nos mistérios. Depois de pensar com muita cautela, Sileno achou que era chegada a hora de ensinar o semideus Dionisus a construir; então, partindo do mais elementar pensou na criação de um belo jarro de cerâmica. Ele aguardou até que Dionisus fosse a ele em busca de mais um desafio, e logo numa bela tarde de primavera, o brincalhão Dionisus se aproximou de Sileno acompanhado de Ampolos, o seu melhor amigo. Sileno estava acomodado a uma rocha às sombras de lindas oliveiras, grave como de costume, fingiu não ter visto a aproximação de seu intrépido aluno, porém no momento certo moveu a cabeça em direção a Dionisus e disse: - Você terá que fazer um jarro de cerâmica para conhecer o Olimpo. Dionisus, como sempre ansioso para estar junto aos deuses, perguntou o que era preciso para fazer um jarro de cerâmica. Sileno disse ao jovem semideus que teria de encontrar da mais pura argila e que a melhor delas era encontrada no rio Leto, o rio do esquecimento, porém era uma viagem arriscada, porque as almas usavam das águas do rio Leto para se esquecerem do passado, assim era perigoso perder a memória enquanto colhia a argila. No momento em que Dionisus ia perguntar sobre as outras etapas da confecção do belo jarro de cerâmica, num salto Sileno se distanciou, mas deixando a pista que a jornada ensinaria o jovem semideus tudo o que ele precisasse saber. 


Ampolos estava com medo, mas sentia-se protegido ao lado de seu amigo semideus, já Dionisus ficou eufórico com a possibilidade de decifrar mais um dos mistérios do sábio tutor Sileno, e correu pelo bosque afora procurando uma ninfa que ensinasse o caminho, as ninfas guardavam muitos segredos, conheciam a magia das florestas, falavam com os animais, assim sabiam muito sobre os diferentes caminhos, os atalhos e os riscos de cada jornada. Porém, mesmo que procurando durante toda a tarde, Dionisus não encontrou nenhuma ninfa, cansado e sem esperança de solucionar seu desafio naquele dia, sentou-se com seu amigo Ampolos na margem de um rio; o jovens sentiam cede e ao curvarem seus corpos para beber água, repentinamente um vulto azul claro passou por eles gritando num som muito agudo, eles se assustaram e largaram a água que traziam no côncavo das mãos. Dionisus, fingiu coragem e Ampolos tremia de medo. O jovem semideus, irritado pelo susto, começou a chamar pelo vulto azul claro, para que explicasse sua ousadia de perturbar o descanso e cede do filho de Zeus. De repente, uma grande neblina azulada tomou conta de tudo em volta dos dois rapazes, Ampolos ficou ainda mais assustado, mas Dionisus sentiu fúria, afinal somente os semideuses e deuses são capazes de libertarem as Fúrias contra quem os perturbam. A neblina azul envolvia o corpo dos dois, ao mesmo tempo em que se escutavam muitas vozes, o semideus gritou muito alto, a neblina ficou estática em suspensão no ar, e Dionisus perguntou: - Quem são? E onde estou? Subitamente, toda a neblina azul espalhada pelo ar juntou-se formando o corpo de uma linda mulher azulada, e disse: - Somos as ninfas, agora ondinas e sílfides, juntas para ajuda-lo jovem Dionisus. Dionisus ficou supreso e olhou para Ampolos que estava encolhido por entre os arbustos, conteve sua raiva e pediu que as ninfas lhe respondessem como encontrar a melhor argila do rio Leto. Ninfas: - O rio que você está é uma das margens do rio Leto, a água que vocês queriam beber lhes fariam mal, para colher da argila basta agachar-se e envolver a argila em folhas desse loureiro que está a sua direita. Dionisus ficou entusiasmo, quase a ponto de esquecer que sentiam cede, novamente o semideus buscou ter calma e perguntou as ninfas como encontrar água, todas juntas sorriram e disseram, entre nós temos as ondinas, ergam suas cabeças e abram suas bocas, se sentirem fome sigam a trilha de pessegueiros. E os rapazes sentiram o gosto da chuva saudável e fresca inundarem de calma todo o calor que haviam acumulado ao longo de um dia inteiro. Saciados, os rapazes colheram as folhas do loureiro e juntaram argila suficiente para fazerem o jarro de cerâmica pedido por Sileno. Concluída esta parte, seguiram o caminho dos pessegueiros e enquanto comiam dos pêssegos, eles percebiam que algo diferente acontecia com eles, a cada novo pêssego que comiam, uma nova ideia vinha a cabeça sobre o que fazer no jarro de cerâmica: surgiam formas, linhas e desenhos; seguiam o caminho em sorrisos tentando guardar cada uma das imagens. Ao final do caminho dos pessegueiros, avistaram uma grande rocha plana, saíram em disparada correndo até aquela misteriosa rocha. Neste momento Ampolos tropeçou e bateu a cabeça em uma pedra pontiaguda, Dionisus foi ao socorro do amigo, mas ele estava fraco e escorria muito sangue de sua testa. Mesmo sendo Dionisus um semideus, tinha seus sentimentos, mais sentimento ainda pelo jovem Ampolos que era o companheiro de aventuras, Dionisus chorou, chorou e chorou ainda mais; estava muito triste, mas precisava mais que tristeza para aplacar a sabedoria do filho de Zeus, naquela momento Dionisus lembrou-se da ambrosia, fruto dos deuses capaz de criar os imortais; desesperado o semideus correu pelo bosque adentro em busca de ambrosia, encontrou colheu da fruta e curvou ao lado do corpo do companheiro espremendo ambrosia em sua boca, alguns minutos depois galhos começaram a surgir do corpo de seu amigo, o sangue foi recolhido do chão formando pequeninas bagas avermelhadas, absorvido pela visão assustadora Dionisus presenciou o surgimento da primeira videira na face da terra. Ele tinha eternizado seu amigo Ampolos como uma linda parreira de uvas que cresce próximo aquela bela rocha. Ainda triste, estava satisfeito, havia conseguido um destino menos pior para sua amigo Ampolos. Em respeito à memória de seu amigo de jornadas, foi para junto da rocha, viu que esta ficava no limite de um grande abismo, sentiu sua textura, percebeu que era muito lisa, deixou-se guiar pela imaginação fazendo um jarro tão lindo que depois de molda-lo nem conseguia acreditar que era obra dele. Dionisus ficou tão encantado por sua obra que mal conseguia sair do lugar, o tempo passava e ele permanecia olhando para o jarro como que por encantamento, repentinamente uma coruja sobrevoou sua cabeça e o susto revelou uma outra necessidade ao semideus, o jarro estava moldado, mas era mole, e abaixo do abismo reluzia uma luz avermelhada. Inteligente e curioso, Dionisus desceu por entre as pedras, escorregou algumas vezes, mas segurava o jarro com firmeza, chegou ao final do abismo em segurança, ele e o jarro. Percebeu que o jarro havia se modificado, se aborreceu a ponto de quase esquecer o lugar de onde aquela luz vinha, foi nesse momento, que uma grande explosão pode ser escutada dentro de uma caverna, luz e calor tomaram conta do lugar, no entanto, ele pode ver o lugar de onde surgiu tanta força, correu até a entrada de uma caverna, nova explosão e luzes e faíscas incandescentes por todos os lados, depois de uma fumaça escura sair por sua entrada avistou um homem avermelhado e coxo batendo em uma bigorna, Dionisus teve seu primeiro encontro com Vulcâno o deus das forjas, dos metais, das criações de ferramentas, o ferreiro do Olimpo; o jovem semideus ficou intimidado, mas aproximou-se pedindo licença ao deus, mesmo que sua figura impusesse medo, ele era um ser bondoso e dedicado ao constante trabalho de criar novos instrumentos para atender às necessidades de cada deus do Olimpo. Efaísto, ou deus Vulcano, notou que Dionisus trazia um belo jarro moldado, porém sem cozimento, preferiu se calar e aguardar que o rapaz solicita-se ajuda, afinal se tratava de semideus a quem ele também pretendia ajudar, neste momento, sem que houvesse explicação Dionisus ergueu o jarro em direção a Vulcano, este tomou o jarro em suas mãos e o colocou no forno para realizar o cozimento; argila moldada na forma de uma belo jarro iria se torna a mais nobre cerâmica conhecida por todo o Olimpo. Se trocarem nenhuma palavra e envolvidos no alvoroço de muitos sentimentos, o jarro ia sendo cozido; o fogo parecia selecionar quais sentimentos deviam permanecer no jarro, isso acontecia involuntariamente, enquanto os dois aguardavam em silêncio, nenhum dos dois parecia saber que sentimentos estavam gravados naquele jarro de cerâmica, o jarro era indecifrável por deuses, humanos e todos os seres existentes ou que um dia poderiam existir; este era o mistério do fogo, um elemento incontrolável em sua essência, ainda que se controle o foco de uma chama jamais se modifica sua essência. O jarro havia se tornado cerâmica: enigmática, indecifrável, indestrutível, eternizando todo o trajeto do jovem semideus. Concluído o cozimento, e depois do resfriamento da cerâmica, Dionisus recebeu de Vulcano o jarro, inclinou a cabeça em sinal de gratidão e saiu da caverna sem que os dois tenham trocado uma única palavra. O semideus sabia que levava em suas mãos algo diferente de tudo que o mundo conheceu, isso criou nele a percepção de ser também ele semelhante aquele jarro de cerâmica, escalou cuidadosamente a encosta do abismo, chegou ao cume do abismo e instintivamente colheu das uvas que seu amigo Ampolos havia sido transformado por seu intermédio, espremeu as uvas dentro do jarro e fez o caminho de regresso em busca de Sileno; era uma manhã e o tempo variava do quente e úmido ao frio e seco. Quando avistou Sileno na mesma rocha do dia anterior, Dionisus correu chorando e revivendo todas as emoções de sua jornada, suas lágrimas caíram dentro do jarro; Sileno viu tudo aquilo e recebeu o semideus o como um novo deus olímpico, esperou que se acalmasse sozinho, depois o sábio Sileno convidou-o à beber do que estava naquele belo jarro de cerâmica; bebiam, se reconheciam, revivam tudo, choravam e gargalhavam sem necessidade de uma explicação mais profunda, a bebida capaz de encantar até mesmo os deuses havia sido criada, o vinho era a chave para que Dionisus pudesse chegar ao Olimpo, sair do Olimpo quando quisesse, era a liberdade do deus, o deus de todos os mistérios.